Informação
Marsilea quadrifolia
L.
-
Polypodiopsida (Filicopsida)
-
Monilophyta (Pteridophyta)
Helófito
Desde o S Polonia e SW Ucrania até ao S Europa
Trevo-de-quatro-folhas
Não
Classificação IUCN
Ameaças
Nenhuma ameaça importante foi relatada.
Medidas de conservação
Nenhuma medida de conservação no lugar.
Distribuição em Portugal
Dizer adeus não é tarefa fácil, provavelmente pela enorme mistura de sentimentos que isso implica. Um dos piores adeuses é aquele em que está implícita uma forte dose de culpabilidade, especialmente quando nós somos a causa dessa partida. Essas despedidas são dolorosas e muito relutantes. Ver partir um ser querido porque não soubemos conviver com ele é uma dor que vai matando a nossa alma e a vontade de viver, e o Trevo-de-quatro-folhas (Marsilea quadrifolia L., família Marsileaceae) representa essa traumática e dilacerante realidade.
Escolhemos esta fotografia do nosso amigo Paulo Barros não pela sua beleza, mas sim porque representa perfeitamente como fomos transformando os habitats deste feto aquático. No passado esta planta povoava os charcos da Beira Litoral e as margens do rio Douro (e provavelmente do Tejo). Mas muito mudou desde então. O ser humano afastou-se dos ecossistemas e quis transformá-los nos seus escravos, sempre fiéis e calados. A nossa exuberante estupidez levou-nos a guerras perdidas e batalhas intermináveis. Uma delas ainda está a ser muito bem visível nas nossas paisagens agro-florestais. O agricultor tem a enorme responsabilidade de gerir os ecossistemas que o ajudam na sua produção. Nesse sentido os agroecossistemas proporcionam benefícios ao Homem, ensinando-lhe as vantagens que a interação da produção agro-florestal com as funcionalidades desses ecossistemas têm. Em troca nos iniciamos há séculos uma guerra interminável, em que tentamos eliminar os trabalhadores que os ecossistemas nos proporcionam. O Trevo-de-quatro-folhas chegou a criar cobertura vegetal natural nos arrozais da Beira Litoral até à década dos anos oitenta. Esse tapete vegetal era fundamental para controlar pragas e doenças nesses arrozais, ao mesmo tempo que proporcionava uma qualidade genuína e diferencial no arroz recolhido nessas culturas. Mas o agricultor decidiu utilizar herbicidas que mataram este valiosíssimo trabalhador. O tempo foi quem marcou a sentença. Outras plantas bem mais agressivas foram chamadas para lutar contra aquele que era o agressor, e uma guerra surda e suicida foi abrindo feridas incuráveis. Hoje as charcas e culturas higrófilas beirãs são um poço de raiva e desespero, num ecossistema aterrado pela dor e o sofrimento.
O Trevo-de-quatro-folhas ainda tinha o rio Douro (e quiçá o Tejo) como últimos refúgios onde poder encontrar abrigo. Barragens e alterações de caudais e leitos de cheia acabaram por expulsar este feto Pérmico das nossas já muito feridas e doentes paisagens. A foto de hoje representa perfeitamente um grito de desespero no fim da década dos noventa. Os últimos Trevos-de-quatro-folhas estavam ainda a lutar contra as incontornáveis mudanças de vegetação das margens durienses. Por entre Paspalum, Phragmites, Brachypodium e Poa as últimas frondes deste português insigne, mas humilde, procuravam os derradeiros raios de luz, daquela luz clara e radiante que os acariciou ao longo de tantos milhões de anos. Daquela luz que finalmente nós conseguimos apagar!
Por: António Crespí
Marsilea batardae
(mesmo género)
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